quinta-feira, 8 de novembro de 2012

FOLHINHA DE SÃO PAULO, O SUPLEMENTO QUE MARCOU GERAÇÕES

Capa do número 1

Quando Lenita Miranda de Figueiredo, a Tia Lenita, criou junto a editoria da FOLHA DE SÃO PAULO o suplemento infantil FOLHINHA, não poderia imaginar o que ela se tornaria para seus leitores. Um sonho, uma fábula, uma viagem a um mundo de conhecimento, informação, divertimento e entretenimento, que vinha encartada todo domingo no jornal que os pais compravam. A criança acabara de ganhar seu próprio jornal. A idéia era exatamente essa, mas a proposta foi além.

Lançada em 08 de setembro de 1963, tinha como missão formar o futuro leitor da FOLHA, ser fonte de pesquisa para seus trabalhos escolares, divertir e ajudar no seu crescimento intelectual. Para a criação do suplemento abriu-se uma concorrência, que contou com a participação do então iniciante Maurício de Sousa (que já publicava na FOLHA) e de Barbosa Lessa Produções, que apresentou um projeto mais juvenil, com trabalhos de Rodolfo Zalla, Colonnese, Manoel Victor Filho e Júlio Shimamoto. A Folha escolheu então o projeto de Maurício, que também contou com a participação de Shimamoto e de Paulo Hamasaki.

Anúncio de lançamento da FOLHINHA, na tira diária do Cebolinha. FSP, 1963

No primeiro número, o editorial colocava a própria Folhinha se apresentando aos leitores como fonte de leitura sadia e de entretenimento, os convidava a colaborar em suas páginas e já previa: Quem sabe se vocês encontrarão um dia em mim, o árduo e querido caminho para o jornalismo profissional.
O suplemento com 16 páginas, apresentou em sua primeira edição as seções: Maravilhas da natureza, Histórias da Tia Lenita, O assunto é Teatro (com dicas de pecas teatrais), Você Sabia, Aprenda Brincando, Literatura, além de matérias como O que você vai ser quando crescer, O menino que foi ao Zôo medir o pescoço da Girafa, entre outras. A personagem Augustinha, desenhada por Maurício, dava aulas de etiqueta para as meninas. Nos quadrinhos, quase tudo de Maurício de Sousa: tirinha do PAPA-CAPIM e páginas com hqs de RAPOSÃO e HORÁCIO, e uma página apresentava o primeiro capítulo da hq O GAÚCHO, que embora saísse com o copyright MSP, era criação de Julio Shimamoto, que a recebera como pagamento pelo trabalho na elaboração do projeto da FOLHINHA.

Para as meninas, Augustinha dava aulas de etiqueta, ou como se dizia na época, de bom-tom. Folhinha n. 1, 1963.


O GAÚCHO, de Julio Shimamoto, foi publicada por quase três anos e quase virou
seriado na TV TUPI.
Folhinha, dezembro de 1963.
Contando com o apoio e orientação da Secretaria da Educação e Cultura, o jornalzinho caiu no gosto da criançada e com o passar dos anos foi se aprimorando, sempre procurando acompanhar os costumes e as mudanças de cada época e a modernização e evolução do ensino.
Vários ilustradores eram convidados a participar, muitos deles em início de carreira. Eduardo Vetillo foi um deles, que, por um período ilustrou as páginas centrais. Maurício de Sousa continuava como ilustrador principal e ampliava cada vez mais seu estúdio, que funcionava no próprio edifício sede da FOLHA.
Durante a década de 1960, a Folhinha sofreu redução do seu número de páginas, chegando a década seguinte com apenas 8, metade do formato original. O suplemento só voltaria a ter 16 páginas novamente, a partir de 19 de maio do ano de 1974.


Capa de Kimura, um dos muitos ilustradores convidados.


Capa da edição 576 da FOLHINHA, que apresentava um novo formato. Ano de 1974. 
Em 22 de setembro de 1974, a Folhinha entra em nova fase. Adota o formato meio tablóide, totalmente colorido e reformulado. Tal formato era mais próximo de uma revistinha, mais agradável a criança e o conteúdo era enriquecido com novas seções. É essa a fase mais brilhante do suplemento, comandada a partir de então pela jornalista Cecília Zioni.
Seções como Quadrinha da Mamãe, A origem do Seu nome e Cozinheirinha caem no gosto dos leitores. Na seção História, textos enfocando momentos importantes do passado do Brasil e do mundo, que serviam como base para trabalhos escolares. A seção Calendário, explicava a origem e o significado das datas comemorativas. Em Ciências, experiências eram ensinadas, sempre com textos de especialistas.





Em A CRIANÇA ESCREVE, textos enviados pelos leitores eram publicados, podendo ser poesia, conto, prosa, enfim, era um espaço livre. Até os mais crescidinhos tinham sua vez na seção Jovens, que abria espaço para textos e poesias da garotada de 12 anos ou mais. Mas, sem dúvida alguma a emoção maior de muitos leitores era ver seu desenho publicado na Folhinha. Eventualmente trazia problemas para os editores, pois muitas vezes tal reprodução saía ruim, devido ao material utilizado pela criança, como lápis de cor, por exemplo. Mas o que isso importava? Era o desenho dela que estava lá. E mesmo saindo bem fraquinho, seu nome estava grafado e aí então era só sair com o jornal debaixo do braço, mostrando para os colegas, pais e professores, todo orgulhoso! Eu fiz isso e com certeza muitos que estão lendo essa matéria também o fizeram!

A alegria da criança era ver seu desenho na FOLHINHA.

Eram três seções: O DESENHO DOS CAÇULAS, A CRIANÇA DESENHA e FUTURO ARTISTA. Os menorzinhos tinham espaço na primeira. A CRIANÇA DESENHA, publicava desenhos de crianças na faixa dos sete a dez anos. A seção FUTURO ARTISTA publicava histórias em quadrinhos e tirinhas dos leitores. E encantava o aspirante a desenhista que já sonhava em ser um Maurício de Sousa. O nome já previa: FUTURO ARTISTA. Muitos que vibraram com sua tirinha, sua hq, publicada pela primeira vez em um jornal de grande circulação, tornaram-se grandes artistas do traço.

Por onde andará o leitor Júlio de Toledo Lens, que publicou várias hqs na FOLHINHA?
O espaço aberto a publicação de textos dos leitores também os incentivou a escreverem profisionalmente. O jornalista Antonio Barbosa Filho conta em seu blog (abarbosafilho.blogspot.com):
Na verdade, era uma pequena redação sobre o Dia da Pátria, poucas linhas, cujo texto não tenho, nem na memória. Mas ver a redação nas páginas do suplemento da Folha marcou minha vida: a partir dali não poderia ser outra coisa, se não jornalista.

O jornalista Nobu Chinen, especialista em hq, também foi leitor assíduo da Folhinha. E como ele foram muitos, que também tiveram ali a primeira oportunidade de mostrar seu trabalho.
A Folhinha também lançou grandes autores. Eva Furnari publicou ali suas primeiras tirinhas ali. Como colaboradores pudemos acompanhar o trabalho de Regina Melillo de Souza, Edson Gabriel Garcia, Ganymedes José, Edson Kosminsky, Tenê de Casa Branca, Léa Corrêa Pinto, Maria Julieta S. Ormastroni, Eunice Veiga, Angelo Zioni, entre tantos outros. Ilustrações de Moacir Torres, Carlos Avalone, Eduardo Luís (hq OS BATUTAS), Robson Barreto (hq FININHO), Kimura.
Maurício de Sousa apresentou grandes aventuras do dinossaurinho Horácio, todas em capítulos. São dessa época as hqs HORÁCIO E OS NAPÕES e A FLOR DE CACTUS.


Uma edição inesquecível: Natal de 1975. Nela é contada como é comemorado o Natal
em diferentes países.
 


A partir da edição de 30 de janeiro de 1977, a Folhinha passa por nova reformulação. Volta a ter 8 páginas no formato tablóide. Com isso, algumas seções são cortadas e a nossa FUTURO ARTISTA, passa a se chamar simplesmente HUMOR, mas continua publicando tirinhas enviadas pelos leitores.

Capa da edição de 30 de janeiro de 1977, que voltava ao formato tablóide, com oito páginas.


Mesmo com espaço reduzido, a FOLHINHA continuou publicando as tirinhas dos leitores.


Minha estreia...um pouco tardia: 18 de janeiro de 1981, com a tirinha da personagem RITA. Cheguei a levar a carta diretamente na sede da FOLHA, pois não confiava em caixa de coleta...


Depois, acabei mandando mais...

Durante a década de 1980, a Folhinha passa por várias transformações, perdendo inclusive a editora Cecília Zioni, que em 1985 foi substituída por Bel Kranz. As três seções que publicavam desenhos, foram substituídas pela página O espaço é seu. Com a saída de Cecília, a melhor fase do suplemento chegara ao fim.
Em 1987, Maurício de Sousa sai da FOLHA e assina contrato com o jornal O ESTADO DE SÃO PAULO, para produzir o recém-lançado suplemento ESTADINHO.
Com a saída de Maurício, o cartunista Glauco ganha espaço com ilustrações e tirinhas de Geraldinho, versão mirim de Geraldão, seu personagem de maior sucesso. Depois, passou a circular aos sábados e assim foi prosseguindo, chegando a década de 1990 e 2000 sempre procurando acompanhar a evolução da criança, como hoje, que apresenta matérias com links da internet.
A Folhinha foi para uma geração, o mesmo que a célebre O TICO-TICO, que circulou semanalmente entre 1905 e 1962.
E ela ainda está aí. Não sei se causa o mesmo encantamento que aquelas poucas páginas coloridas nos causavam. Não sei se marejam os olhos das crianças de hoje, como ficávamos nós ao ver nossa pequena tirinha ou desenho, ali publicado. As crianças de hoje se encantam com outras coisas. Não sei também se todas as pessoas que trabalharam durante os anos 1960 a 1980 no suplemento, tem a ideia de quanto a Folhinha foi importante na formação moral e principalmente profissional de seus leitores. Pois então, alguns deles estão aqui.
Hoje brilham no mercado editorial, encantando as pessoas com seu trabalho, fazendo o mesmo que o nosso jornalzinho fazia, quando chegava todo domingo.


LAUDO FERREIRA JR

Desenhista nascido em São Vicente, SP, em 1964, é autor da série HISTÓRIAS
DO CLUBE DA ESQUINA, da trilogia YESHUAH e de adptações de clássicos para os
quadrinhos. Ganhador do Prêmio Angelo Agostini de Melhor Desenhista de 2007.
Dirige o Estúdio Banda Desenhada.

BIRA DANTAS

Ubiratan Dantas é chargista, quadrinista e caricaturista, estagiou no Estúdio Ely Barbosa, e
desenhou para a revista Os Trapalhões. Colaborou com as revistas em
quadrinhos QuadrECA, Pântano, Tralha, Porrada, Megazine e Bundas. Ilustrou
publicações empresariais como revistas da IBM, Rockwell Fumagalli, 3M, Lix,
Caterpillar do Brasil, Eaton, e apostilas do Anglo, entre outras.
Foi premiado com o Troféu HQ MIX em 2008, pela adaptação para os quadrinhos
de DOM QUIXOTE.

MAURICIO RICARDO

Maurício Ricardo Quirino é um chargista, cartunista brasileiro e músico.
Foi criado em Uberlândia, em Minas Gerais. É o roteirista e desenhista do
site Charges.com.br, que iniciou por diversão. É o criador das charges do
reality show BIG BROTHER BRASIL, da  Rede Globo de Televisão.

SPACCA

João Spacca de Oliveira é autor de livros em HQ, cartunista e ilustrador. Publicou pela editora
Companhia das Letras o premiado ³Santô e os Pais da Aviação². Lançou também
³Debret², ³D.João Carioca² (em parceria com Lília Schwarcz) e a adaptação de
³Jubiabá² de Jorge Amado para o selo ³Quadrinhos na Cia². Recebeu menção
honrosa em um concurso de desenho da FOLHINHA, quando tinha 11 anos.


ARI NICOLOSI

Ilustrador e animador de curtas e longas metragens, participou de várias
produções dos Estúdios Maurício de Sousa, como AS AVENTURAS DA TURMA DA
MÔNICA (1982), MÔNICA E A SEREIA DO RIO (1987) entre outras. É o autor da
série em animação ZICA E OS CAMALEÕES.


FLÁVIO TEIXEIRA DE JESUS

É um dos roteiristas mais antigos dos Estúdios de Maurício de Sousa, sendo o
autor do primeiro arco de histórias da série TURMA DA MÔNICA JOVEM. Escreveu
também a edição especial de número 50, que apresenta o casamento entre
Mônica e Cebolinha. Quando mandou seu desenho para a FOLHINHA aos 7 anos de
idade, não imaginava que trabalharia no mesmo estúdio que ilustrava o
suplemento.



FERNANDES

Luis Carlos Fernandes é ilustrador e caricaturista. Desenhou para o DIARINHO, suplemento do jornal
DIÁRIO DO GRANDE ABC. Ilustrou em parceria com o desenhista Girotto a série
de livros do CASTELO RÁ-TIM-BUM. Premiado em Salões de Humor, ilustra livros
infantis e para a publicidade.

CLEITON CAFEU

Desenhista e animador, trabalhou nos Estúdios Ely Barbosa, Senninha, HGN,
entre outros. Atualmente dirige seu próprio estúdio de animação, realizando
curtas animados e vinhetas para publicidade.


ROSANA E ROBERTO MUNHOZ

ROSANA MUNHOZ
Foi uma das melhores profissionais que já passaram pelos Estúdios MSP.
Desenhista e roteirista criou inúmeras histórias com os personagens de
Maurício. Mandou seus desenhos para a FOLHINHA e alguns anos depois, já
profissional, passou a ilustrar o suplemento. Faleceu em 1996.

ROBERTO MUNHOZ
Desenhista e roteirista, trabalhou em parceria com a irmã Rosana em hqs para
as revistas Chaves e Revista da Xuxa, para a Editora Globo. Na década de
1990, fundou junto com o desenhista Paulo José a Editora Bingo, que
publicava o jornalzinho KIDNEWS. Atualmente é um dos principais roteiristas
dos Estúdios MSP. Aliás, a parceria com a irmã vem desde pequeno, quando
publicou seus desenhos junto aos dela, na Folhinha.

Essa matéria não termina aqui. Quem participou da Folhinha entre as décadas de 1960 a 1980 e quiser homenageá-la, mande pra cá o seu desenho, texto, ou o que for, que será incluído nessa matéria. Conte-nos como o suplemento influenciou sua vida.
Para encerrar, ela também está aqui: a nossa grande jornalista CECÍLIA ZIONI, que para nós, que ainda temos a nossa criança aqui dentro, vivinha, a nossa TIA CECÍLIA!

ENTREVISTA COM CECÍLIA ZIONI


ALEXANDRE: Quando foi que vc assumiu a editoria da FOLHINHA DE S. PAULO e quais mudanças você promoveu?
CECÍLIA: No começo dos anos 70, quando a redação da Folha de S.Paulo passou por reformulação e fui convidada para o posto, pelo novo redator-chefe, Ruy Lopes. Fui a segunda editora.

ALEXANDRE: Como se escolhia os temas de cada edição? Havia interferência e ou acompanhamento de algum órgão público?
CECÍLIA: Não havia nenhuma interferência - interna ou externa. Como editora, tinha autonomia, subordinada, claro, à linha editorial do jornal, que sempre se pautou pela independência. O objetivo da Folhinha era formar o futuro leitor do jornal; por isso, observava-se um tripé ao definir a pauta: a) informar, b) divertir, c) formar e servir. Neste último item, a ideia era fornecer elementos que complementassem/subsidiassem/auxiliassem o leitor em trabalhos escolares e em seu avanço intelectual - o que incluia publicar textos e desenhos produzidos pela criança e pelo jovem.

ALEXANDRE: Quem escrevia os textos e como se faziam as pesquisas?
CECÍLIA: Os textos jornalísticos eram feitos pela equipe (editora/repórter); os textos didáticos, por professores especializados, convidados pela editoria; os contos e as crônicas, por escritores, também a convite. A propósito, gosto de lembrar que essa "corrente" de excelentes escritores foi formada espontaneamente, com inspiração e ajuda de duas das pessoas mais importantes na literatura brasileira, Tatiana Belinky e Stella Carr.
Mauricio de Sousa e sua equipe produziam quadrinhos, além de ilustrações para todo o suplemento. Ilustradores (novos e/ou conhecidos) eram convidados a participar em todas as edições, para dar diversidade ao suplemento, abrindo espaço para novos talentos e novas experiências. Gosto de lembrar que a primeira tira de Eva Furnari saiu na Folhinha, há mais de 30 anos.

.ALEXANDRE: Quando vc saiu da FOLHINHA e por quê?
CECÍLIA: Sai na metade dos anos 80, em nova reformulação da redação da Folha de S.Paulo. Voltei ao posto anterior, na reportagem da Economia, no mesmo jornal.

ALEXANDRE: Pra vc, como é saber que a FOLHINHA, principalmente durante a sua gestão, incentivou tantas crianças a criar, desenhar, escrever, e que hoje, muitas delas se tornaram excelentes profissionais?
CECÍLIA: Esse é o maior orgulho de minha vida profissional. Tive liberdade, na FSP, para abrir esse espaço a talentos promissores. Meu "prêmio Nobel" pessoal é ver a Folhinha citada como origem de carreira e/ou vocação por vários jornalistas, escritores, ilustradores, chargistas, desenhistas e outros profissionais.
E isso tem significado momentos de alegria. Um exemplo: no final dos anos 90, como repórter de Economia reencontrei um dos jovens "colaboradores" de tirinhas, já então como diretor de banco, expert em investimentos imobiliários. Ele relatou, nessa época, que uma de suas grandes alegrias era ver seus personagens no jornal, quando tinha 15/16 anos.
Outro caso que gosto de lembrar é do jovem que queria ser jornalista, mas o pai preferia que ele fizesse vestibular de Direito. Ele fazia belos textos para a Folhinha e foi me pedir conselhos. Eu o aconselhei a fazer as duas faculdades, uma por ele, outra pelo pai. Ele seguiu meu conselho e hoje, além de escritor considerado, dirige um instituto cultural de renome.
Na mesma linha, é recompensador este seu aparecimento, ainda mais por você se dedicar a uma parte do jornalismo que merece muita atenção e estudo, principalmente agora que as novas mídias eletrônicas ampliam o acesso de crianças à palavra escrita e ao traço!
Agradeço imensamente a participação e o carinho da jornalista Cecília Zioni.

BIBLIOGRAFIA:
ACERVO FOLHA (Também meus sinceros e imensos agradecimentos!)
VOLÚPIA, Julio Shimamoto, Editora Opera Graphica, 2000

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

UM APAIXONADO PELO QUE FAZ


Revista ROCKY LANE. Capa de Primaggio Mantovi. Rio Gráfica e Editora.

Talvez, se não tivesse trabalhado por 24 anos na Disney/Abril, desenhando, escrevendo, editando, coordenando, ensinando e lançando grandes nomes no mercado de quadrinhos, teríamos mais títulos desse grande artista. Pois a vida que o levou a essa trajetória, escondeu o escritor apaixonado por cinema, de texto leve e agradável, mas não o criador e desenhista que participou ativamente do mercado de quadrinhos no Brasil dos anos 1960 a 1990.
Primaggio Mantovi começou sim, lá na década de 1960, no gibi do ROCKY LANE, seu ídolo de infância. Entre as muitas capas que fez, e as histórias que escreveu e desenhou, participou também do gibi do RECRUTA ZERO, outro título importante em sua carreira, que mereceu capas assinadas e histórias exclusivas, já que a RGE (Rio Gráfica e Editora) permitia tal ousadia. Em 1972 lança o palhaço SACARROLHA, criação própria, em um gibi editado pela mesma RGE.


Capa do número 1 da revista Sacarrolha, lançada pela RGE.

O sucesso de seu personagem, o levou a ser contratado pela Editora Abril, onde a partir de 1973, coordena a Escolinha Disney, destinada a formar novos talentos. Sua paixão pelo cinema e pelos filmes de faroeste ficou lá, escondida nos anos seguintes, entre o lançamento de dr. Zôo em tirinhas, do Sacarrolha em merchandising, dos gibis nacionais em que ele batalhou para que cada artista tivesse seu crédito no início das histórias, do gibi dos Trapalhões e sua belíssima Graphic Novel DIDI VOLTA PARA O FUTURO (ganhadora de todos os prêmios em 1991), das adaptações para quadrinhos dos sucessos da Disney nos cinemas (Mulan, Tarzan) e tantas outros projetos que participou e comandou ao longo dos anos em que atuou no Grupo Abril.


Em 2003, o gênero Western, ganha duas obras de fôlego, escritas por Primaggio Mantovi

Na década de 2000, já livre de suas obrigações como diretor editorial, libera sua paixão pelo cinema através da escrita. Sorte nossa. Sai o belíssimo 100 ANOS DE WESTERN, oportuno, já que foi mesmo lançado no centenário do gênero. Obra indispensável para todo amante do cinema, fez muito sucesso e ganhou atenção da mídia em geral, chegando até ao Programa de Jô Soares, onde foi entrevistado. Sua paixão pelo faroeste é tão grande que não coube num livro só. No mesmo ano lança CURIOSIDADES DO WESTERN, com mais informações sobre seus ídolos, seus filmes e bastidores.


Escrito nos anos 1990, LUCIANO apresentou a incrível história do homem que um dia
acorda e percebe que virou uma mulher. Criação de Primaggio Mantovi e
desenhos de Fernando Bonini (1955-2005)

Capa do ALMANAQUE DO SACARROLHA, lançada durante o TROFÉU HQ MIX 2012

Em janeiro de 2005, volta aos quadrinhos lançando o álbum LUCIANO pela Via Lettera. Criação sua, com desenhos do saudoso Fernando Bonini. Em 2007, mais uma vez, sua paixão pelo cinema o leva a escrever O CENTENÁRIO DE JOHN WAYNE, repleto de fotos e com um encarte colorido contendo a filmografia básica do ator e os cartazes de seus filmes. Nesse ano de 2012, o SACARROLHA completa 40 anos e torna-se "a estatueta" da principal premiação de quadrinhos e artes gráficas da América Latina, o TROFÉU HQ MIX. Além disso, ele também volta em uma edição especial intitulada ALMANAQUE DO SACARROLHA, com um material bonito de se ler e ver: formato grande, hqs recoloridas, histórico de capas e o texto gostoso do mestre Primaggio, discorrendo sobre as aventuras de se publicar um personagem próprio no Brasil. Soma-se a tudo isso, palestras, cursos (que já revelaram grandes talentos, especialidade sua, diga-se de passagem), e um sem-número de traduções feitas ao longo desses últimos 10 anos, de hqs Disney, sua outra grande paixão. Aliás, paixão é a melhor palavra para resumir a trajetória de Primaggio. É, e sempre foi um apaixonado pelo que faz. Seja escrevendo ou desenhando.


Almanaque ROCKY LANE, lançado durante o FEST COMIX 2012

E foi com essa mesma paixão, que ele foi buscar, lá nos longíquos anos 1960, o seu cáubói de infância: ROCKY LANE, e o trouxe á vida novamente, através do ALMANAQUE ROCKY LANE, lançado recentemente pela CLUQ-Clube dos Quadrinhos, de Wagner Augusto. E mais uma vez apaixona o leitor, contando a sua história de vida, das idas ao cinema com os pais para assistir aos filmes de faroeste e especialmente os que tinham nos créditos o ator Allan Rocky Lane, a trabalhar nos próprios quadrinhos de ROCKY LANE, na RGE. Sua narrativa nos remete a um boa conversa, pontuada por informações precisas (datas, nomes de filmes, curiosidades, nada o escapa) entre Primaggio e o leitor, que ao meu ver, entenderá porque a carreira desse grande artista sempre foi vitoriosa: porque tudo foi feito com muita paixão.
Paixão que ainda o motiva, mesmo estando com 67 anos, onde nessa idade, muitos já penduraram as chuteiras. Pois vem aí mais um livro. Este, sobre o gênio Walt Disney.
E vamos lá...nos apaixonar novamente.

O TEMPO FAZ OS VERDADEIROS AMIGOS.
Concordo plenamente, Primo!

PARA ADQUIRIR A OBRA ALMANAQUE ROCKY LANE, mande e-mail para:
ou escreva para:
R. João Batista Pereira, 131 - Butantã - São Paulo - SP
05596-090
PREÇO: R$ 35,00 (frete incluso)

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

PATRÍCIA ZACCARIAS


Quem a conheceu, sabia que a sua delicadeza como pessoa também se podia sentir na sua arte. Uma arte firme, precisa, mas acima de tudo, delicada, singela, bonita de se ver. Com um pincel na mão, ela tornava cada traço, cada desenho, mais vibrante, pulsante, ganhando vida. Arte final é isso. E quando se tem amor, paixão, pelo que faz, aí é que tudo fica lindo.
Patricia Zaccarias era assim. Apaixonada por desenho, por criação, por arte.
Sua estrela começou a brilhar lá no início da década de 1990, na revista O Pequeno Ninja, chegou ao tablóide infantil KIDNEWS, de Paulo José e Roberto Munhoz, onde trabalhou com inúmeros personagens, demonstrando versatilidade e rapidez, tornando-se a arte-finalista oficial do jornal. Com o fim da publicação, sua estrela foi brilhar na Fábrica de Sonhos. Dos nossos sonhos e boas lembranças da infância: os Estúdios Maurício de Sousa. Aí tudo ficou ainda mais bonito! Emprestou sua arte para muitas e muitas hqs do Cebolinha, da Mônica, Cascão, Magali, Chico Bento, Piteco, Bidu...enfim, toda a turminha passou pelo seu belo traço. E depois de tanto brilhar, brilhar e brilhar com seu talento, embelezando ainda mais cada traço, cada desenho, cada quadrinho criado nos Estúdios MSP, sua estrela se apagou neste dia 17 de outubro de 2012. Mas sua arte não morre. É eterna. Está aí sendo publicada pelo mundo afora nas aventuras da turminha. E a estrela não brilha mais aqui, mas está lá, se olharmos para cima, em algum cantinho do céu. Junto com todas as outras estrelas que iluminam as noites. Com a mesma vibração e luz de quando brilhava por aqui.
Saudades Pat!

sábado, 6 de outubro de 2012

SENNINHA: O GIBI QUE VENCEU A MORTE


Capa do número 0 do SENNINHA

Enquanto as vendas da maioria dos gibis caíam, devido a situação econômica do país, um gibi surgia na contramão de tudo isso. Só a Editora Abril Jovem, na época, a maior na área de quadrinhos, para apostar em uma nova publicação do gênero, e o que é pior ou melhor: era uma produção nacional. Surgia então, a revista em quadrinhos do SENNINHA!


A IDEIA
A paixão pela Fórmula 1, uniu o publicitário Rogério Martins e o desenhista Ridaut Dias Jr. em torno de uma ideia: criar uma história em quadrinhos inspirada no grande piloto Ayrton Senna. Corria o ano de 1990, e Senna acabara de conquistar o segundo título mundial de F1. Depois de muitos estudos, estava criada toda a ambientação para as hqs da versão mirim do piloto. O projeto só chegou ás mãos de Ayrton em 1993, que de imediato aprovou a ideia. Mas nem todos da família gostaram. Seu pai, Milton da Silva, era contra. Mesmo assim, Ayrton deu aval para que a dupla continuasse desenvolvendo. O projeto foi apresentado para a Abril Jovem, na época a maior editora de quadrinhos do Brasil.

OS PERSONAGENS
Senninha
não surgiu para contar as aventuras de infância do piloto. Embora inspirado nas suas feições, o personagem era um admirador de Ayrton Senna. Sua turma era composta por meninos e meninas de um mesmo bairro, que viviam grandes aventuras, muitas delas envolvendo competições com uma turma "da pesada" comandada pelo trapaceiro "Braço Duro". Alguns personagens eram batizados em homenagem a alguém. Johnny, que projetava os carros do Senninha, era uma homenagem a Johnny Herbert, piloto da Lotus. JJ, amigo do Senninha fanático por esportes, homenageava JJ Lehto, piloto da Minardi na época. E seus irmãos nas hqs, não precisa nem dizer. GIGI (fácil alusão a Viviane Senna) e TÉO, para não ficar LÉO (de Leonardo). Enfim, uma bela galeria de personagens foi criada para dar sustentação as aventuras.




A PREPARAÇÃO
Em 27 de janeiro de 1994, Ayrton Senna apresentou para a imprensa o projeto SENNINHA. O investimento inicial foi de US$ 2 milhões e a promessa é que a revista seria publicada também na Argentina e no Japão. Incluía também uma série de animação com 52 episódios e um filme para cinema, além da marca estampar uma série de produtos. Em entrevista, Senna disse: Senninha e sua turma não visa só o lado comercial, mas também o humano. Será um canal de comunicação com as crianças, para levar a elas noções de vida esportiva, lazer, respeito e formas de se conviver com as vitórias e também com as derrotas.
Em 22 de fevereiro de 1994 foi lançado o número 0 da revista em quadrinhos SENNINHA E SUA TURMA, encartado em várias publicações da Editora Abril. Esse especial de 16 páginas, apresentava todos os personagens e contava o nascimento do Senninha, desde a maternidade, o seu gosto só por carrinhos, e depois, pela velocidade, sempre correndo, seja no andador, seja de patins, ou guiando carrinhos no supermercado. Contava também como o Senninha era escolhido para ser o piloto oficial da turma do bairro e deixava um suspense na última página com a largada da primeira corrida onde Senninha disputava com o trapaçeiro Braço Duro. Quem iria ganhar? Para saber, só comprando nas bancas a edição 1.



O LANÇAMENTO
SENNINHA chegou ás bancas em março de 1994, com tiragem de 150 mil exemplares, periodicidade quinzenal, 36 páginas em papel especial, que valorizava as cores. A primeira história dava continuidade a hq apresentada no número 0. O roteiro era assinado por Mário Mattoso, com desenhos de Roberto Fukue, arte final de Marcos Uesono e Jorge Caxeado, cores de Claudio Ishii. A revista era produzida dentro dos estúdios da Abril Jovem, dirigidos por Primaggio Mantovi, com supervisão e consultoria da Ayrton Senna Licensing, empresa recém-criada para administrar a marca. Localizada no bairro de Santana em São Paulo, a ASL tinha um núcleo de criação, comandado por Rogério e Ridaut, além de excelentes artistas como Marco Cortez, Alexandre Montandon, Mário Mattoso, Jairo Avalle e consultoria de quadrinhos do mestre Waldir Igayara.O número 1 trazia também uma entrevista com o piloto em que ele falava sobre o seu início de carreira, gostos pessoais e também sobre os testes que estava fazendo com a Williams.


A FATALIDADE
Quando o número 4 estava as bancas, o inesperado acontece. Ayrton Senna falece aos 34 anos de idade após sofrer um grave acidente no GP de San Marino, em 1 de maio de 1994. Ninguém conseguia acreditar. O Brasil parou. A produção do gibi parou por várias semanas. O que fazer com o projeto recém-lançado? Nunca houve algo semelhante na história da hq brasileira. A morte do protagonista da revista, logo no início do projeto. Rogério e Ridaut pararam com tudo, estarrecidos. A editora ficou a espera de uma decisão da família Senna sobre o que fazer. Curiosamente, a dupla recebeu a notícia sobre a continuação do projeto pelo pai de Ayrton, que a princípio era contra a criação. Mas era uma forma de homenagear o filho, dando continuidade a um projeto que ele tanto gostava. Apesar da imensa dor, Rogério e Ridaut retomaram o projeto.
Na edição 5, que chegou as bancas poucos dias depois do acidente, a editora apressou-se em colocar um encarte, com uma ilustração onde todos os personagens estão tristes pela perda de seu ídolo e criador, acompanhado de um belíssimo texto assinado por Rogério e Ridaut. Um momento único nos quadrinhos.
Na edição 6, era preciso explicar ao leitor como a morte de Senna era encarada pelos personagen, especialmente o Senninha, seu grande admirador. Talvez a única hq de toda a série que não contou nenhuma aventura do herói, nem uma piada, nada. Era um desabafo, um grito sufocado de dor, escrito por Rogério e desenhado por Ridaut, que fez o leitor chorar.
No período de junho a setembro saiu apenas uma edição por mês. Com uma equipe completamente abalada, era impossível manter a periodicidade quinzenal.


Encarte do número 5. Na ilustração, a tristeza de todos os personagens.
A morte de Ayrton Senna chegara ao gibi.


Página da hq O HERÓI, publicada no n. 6. Senninha e seu irmão choram
a morte de seu ídolo. E emocionam o leitor.
Argumento: Rogério. Desenho: Ridaut. Arte final: Marcos Uesono. Cores: Fabíola Braido
 
A REFORMULAÇÃO
Em outubro de 1994, chegava a edição 10, com uma grande reformulação. a revista passa oficialmente a ser mensal e com o dobro de páginas. Tal mudança já era uma tentativa de equilibrar os custos da revista, que já sofria com um mercado em retração. Distribuir duas edições por mês tinha um custo muito alto, e pouco tempo de exposição em bancas. Aproveitou-se a ocasião também para relançar o título. Em uma edição especial numerada como 10A com 34 páginas e distribuída junto com a revista QUATRO RODAS, a revista recontava de forma resumida o nascimento do personagem (uma adaptação da hq publicada no número 0) e avançava até o dia da morte de Senna, republicando na sequência a hq especial O HERÓI, que trazia a morte do piloto para as hqs. A hq seguinte era ambientada no tradicional Salão do Automóvel, que de fato, estava sendo realizado naquele mês. Também como parte das mudanças, o seu capacete ganhava vida e poderes mágicos e passava a ter um nome: MEU HERÓI. Seu uniforme mudou do azul da Williams para o vermelho da McLaren, equipe onde ele fora tricampeão. Para essa fase, ainda tão difícil para a equipe, foi convidado o desenhista Aluir Amâncio. Já a partir desse número 10, Aluir passa a desenhar quase todas as hqs, contando com arte final de Jaime Podavin, João Anselmo, entre outros. Isso por um período de dois anos. Quem também entrou nessa nova fase foi Marcelo Verde, criando boa parte das histórias. Algum tempo depois, Aluir contrata o desenhista Anderson Nunes para ajudá-lo. 


Capa do n. 10A, encartado na revista QUATRO RODAS.

Em novembro de 1994, foi fundado o INSTITUTO AYRTON SENNA, presidido por Viviane Senna, com o propósito de destinar parte dos lucros arrecadados com o licenciamento de produtos, para a realização de projetos educacionais e de apoio a criança carente. Era o sonho de Ayrton virando realidade.
Na edição 17 (maio de 95) novamente a morte de Senna era lembrada, com um texto de Rogério e Ridaut no início, contando sobre o quanto foi difícil para a equipe trabalhar durante esse primeiro ano, sem o seu mentor.
A partir do número 42 (terceiro ano da série) nova reformulação. A revista volta a ser quinzenal, e passa a ter apenas 36 páginas impressas em papel inferior. Nessa época, acontece também a saída de Ridaut Dias Jr. do projeto. Alegando querer fazer outras coisas que não podia, por causa de seu contrato, descobriu-se depois que havia um motivo maior.


Com a edição 17, completava-se 1 ano de revista. Um ano muito difícil, principalmente
para a equipe que a produzia.


Equipe de animação do INSTITUTO AYRTON SENNA.

O PROCESSO
Na verdade, Ridaut saiu por divergências relacionadas a utilização da imagem do personagem. Segundo reportagem publicada no UOL ESPORTES em 12/08/2010 por Rafael Krieger e Rubens Lisboa, Ridaut declarou que saiu e pediu revisão contratual. Não conseguiu e desistiu da ação jurídica. Rogério Martins saiu do projeto dois anos depois, abrindo um outro processo, esse por não haver mais indicação de sua autoria. Suas assinaturas haviam saído de todos os produtos e os personagens teriam sido alterados. Um outro processo também foi aberto pedindo a reparação de danos sobre direitos patrimoniais sobre o personagem
"A gente não conseguia se entender com a família. Sempre foi difícil, porque tìnhamos um acordo verbal com o Ayrton e sem ele ficamos órfãos. Passamos a ser empregados e só continuamos por vontade de manter o personagem.
– declarou Rogério. O que de fato ocorreu, segundo ele, é que após a morte do Ayrton, a família apresentou-lhes um novo contrato, que os colocava apenas como desenhistas, assegurando -lhes um valor pela produção da revista e tirando-lhes o direito de receber os royaltes, já que eram os criadores do personagem. "Eles ficaram com todos os direitos, e a gente sem nada"-afirmou Rogério.
Bem antes, em 2004, Rogério Martins havia dado a seguinte declaração ao ESTADÃO: "Sempre tentaram esconder nossos nomes, são dez anos de uma criação que enfrentou vários revezes e um clima de trabalho péssimo", acusa. Ele diz que foi obrigado a assinar um "contrato espartano", regido pela CLT. "Era isso ou davamos adeus ao sonho de desenvolver o personagem inspirado pelos ideais e pelo jeito de ser de Ayrton Senna", revela. "Senna afirmou que poderíamos assinar o contrato que ele garantiria. Nós tínhamos uma relação de confiança muito boa, mas quatro meses depois ele morreu."
O que pode ser observado a partir da saída de Ridaut (edição 42), é que já não havia mais a assinatura dos dois nas capas, porém ela aparecia no primeiro quadrinho de cada hq. Na capa, foi substituída pelos dizeres: CRIADORES DO PERSONAGEM: ROGÉRIO M. MARTINS / RIDAUT DIAS JR. O que é mantido até hoje.


Ridaut, Viviane Senna e Rogério Martins.


Desde o número 1, a revista sempre contou com grandes artistas. Nessa primeira fase na Abril Jovem entre tantos, destacaram-se: Aluir Amâncio, Roberto Fukue, Mário Mattoso, Alexandre Montandon, Marcos Uesono, Adriana Mingati, Marcelo Verde.



Na segunda fase da revista, já em nova editora, novos artistas emprestam seu talento ao personagem: Anderson Nunes, Dong Hang Yi, Marcelo Conquista, Genoviz.

A MUDANÇA DE EDITORA
Em 1999, com queda nas vendas e com a crise em que passava a Abril Jovem (que deixara de ser empresa e voltava a ser um departamento do grupo) o título passa para a novata BRAINSTORE EDITORA, de propriedade do quadrinista Eloyr Pacheco que mantém a numeração original. Rogério Martins já saíra do grupo, e nota-se que suas assinaturas também saíram das hqs. O desenho em geral sofre uma pequena reformulação. Essa fase da BRAINSTORE durou apenas 6 edições (98 a 103). Após sua saída das bancas, o personagem continuou um caminho bem sucedido no merchandisng estampando dezenas de produtos no mercado.


Capa do n. 1 do SENNINHA pela HQM Editora. Equipe enxuta formada por: Kaled K. Kanbour, Anderson Nunes, Dong Hang Yi, Marcos Uesono e Marcelo Conquista 

O RETORNO
SENNINHA voltou em março de 2008, pela HQM EDITORA. em uma parceria com o INSTITUTO AYRTON SENNA Era necessário apresentar o personagem a uma nova geração de leitores. Um belo álbum foi lançado: AYRTON SENNA, UM HERÓI BRASILEIRO. Com 60 páginas em formato grande e totalmente colorido, trazia uma bela história em quadrinhos, que contava a história do grande piloto de F1 em meio as aventuras de Senninha e sua turma. Foi lançada durante a 14 FEST COMIX.
No mês seguinte chegava ás bancas o número 1 da nova revista do SENNINHA. Com 36 páginas coloridas, a publicação apresentava aventuras inéditas da turma, feitas por uma equipe bem mais enxuta, porém de artistas que estavam no projeto a bastante tempo. Da edição 1 a 5 teve periodicidade mensal. (de abril a agosto) A edição 6 saiu só em dezembro de 2008. Um atraso de 4 meses. Em janeiro de 2009 saiu a edição 7, porém a edição 8 saiu somente nove meses depois, encerrando de vez a publicação. Ainda se tentou colocá-lo nas bancas novamente através da SÉRIE INFANTO JUVENIL HQM, onde cada edição apresentaria um personagem diferente. SENNINHA saiu no número 1, em formato americano, com 36 páginas. E não retornou mais ás bancas. Porém está na internet, através do portal www.senninha,com.br, onde o internauta tem acesso a hqs, passatempos, desenhos animados, jogos, dowload e muito mais.
Continua fazendo muito sucesso, participando de campanhas institucionais, de diversos eventos, está estampado em vários produtos, mesmo não tendo o apoio de um gibi.
E tal e qual seu mentor e inspirador AYRTON SENNA, o SENNINHA tornou-se um grande vencedor. Sobreviveu á morte de seu ídolo, logo no início, mantendo-se em bancas por 103 números, virou caso de justiça, reapareceu e sumiu das bancas, mantendo-se sempre nos produtos, mas a maior vitória deste grande personagem foi realizar o sonho do grande AYRTON SENNA, de ajudar milhares de crianças e jovens carentes a terem dignidade e uma educação de qualidade.




 

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

KIDNEWS! ...E O QUADRINHO BRASILEIRO INVADIU AS ESCOLAS!



Em uma época em que revistas em quadrinhos de sucesso eram canceladas, devido a recessão econômica provocada pelo governo do então presidente Fernando Collor de Mello, uma grande ideia era lançada, apesar de tudo apontar para ser um retumbante fracasso. Afinal, Urtigão, Turma do Arrepio, Chapolim e Chaves, estavam se retirando das bancas. Não era hora de lançar uma revista mix, ainda mais só com quadrinhos nacionais. Mas, e se ela não fosse para as bancas, mas sim, distribuída nas escolas? E se não fosse uma revista, mas sim, um jornal, tablóide? E se buscasse patrocinadores para "bancar" a sua distribuição aos alunos? Todas essas questões passaram pela cabeça do desenhista e animador Paulo José, e seu sócio, Roberto Munhoz, também desenhista e roteirista.
Assim nasceu KIDNEWS, jornal infantil no formato 1/2 tablóide, com 08 páginas, sendo quatro coloridas. A tiragem inicial era de 30.000 exemplares, distribuídos gratuitamente nas principais escolas particulares de São Paulo. O público era bem definido e logo atraiu bons anunciantes. Já que o jornal era só de quadrinhos, a ideia era criar anúncios no formato de hqs, com personagens especialmente criados para tal empresa e seus produtos. Isso na verdade, era um aprimoramento da ideia que o desenhista Ely Barbosa tivera no início da década de 1980, quando lançou o JORNALZINHO DO CACÁ, encartado no jornal METRÔ NEWS, distribuído gratuitamente nas estações de metrô de São Paulo. Em 1990, também existiu o SPORT GANG, jornal criado pela dupla Jal e Gual, voltado aos alunos, com quadrinhos criados também por Otavio Cariello e Kipper.

Jornalzinho do Cacá, de Ely Barbosa. Distribuído junto ao Metrô News, nas
estações de Metrô de São Paulo.

Capa da edição 18 (abril de 1995) que foi distribuída durante o HQ MIX.

Para produzir o jornal mensalmente, o desenhista Paulo José após uma longa carreira de animador e desenhista (fundou a Thalia Filmes), com passagens pelos estúdios de Maurício de Sousa, Hanna Barbera, Editora Abril (revista do FAUSTÃO) e Globo (REVISTA DA XUXA), criou junto a Roberto Munhoz, a Editora Bingo Comunicação, situada em um belo sobrado no bairro do Sumaré.
KIDNEWS chegava ao público "ancorado" pelo Sapo Xulé, criação de Paulo José, baseado na cantiga de roda "O Sapo não lava o pé", que já tinha se transformado em brinquedos e games de grande sucesso.
O conteúdo editorial era variado, alternando hqs com personagens institucionais, passatempos, séries culturais para serem utilizadas para trabalhos e discussões durante o ano letivo, concursos e também quadrinhos sem vinculação alguma com qualquer empresa.
Além de uma pequena equipe interna, o jornal contava com a assessoria de psicólogos e pedagogos, e também de desenhistas colaboradores, que eram convidados por Paulo José para ali publicarem seus personagens, muitos deles inéditos. Era uma grande oportunidade.


A partir do numero 3, a publicação passa a ter 16 páginas, sendo 8 coloridas.
Em 1994, sua tiragem atingiu a marca de 100.000 exemplares mensais, prosseguindo assim até 1996. A partir do numero 16 (fevereiro-1995), seu formato mudou para 1/4 de tablóide, ficando assim bem mais adequado ao seu público, por se aproximar das demais revistas infantis. Circulou em mais de 200 escolas particulares de São Paulo, além de escolas públicas de Vila Paulicéia e Indaiatuba.
KIDNEWS deu uma grande contribuição ao quadrinho brasileiro, abrindo suas páginas para que artistas novos ou veteranos, publicassem seus personagens. Durante os seus 5 anos de publicação, pudemos apreciar o trabalho dos seguintes autores:
JAL (SPORT GANG) do jornal homônimo
Genival de Souza (TED)
Heloísa Galves (HOLDA, OS DUENDES)
José Miguel Lara (ANDRÉ)
Adeir Rampazzo (ORELHINHA)
Luiz Ferré (TV COLOSSO) em hqs criadas por Marcelo Alencar e Sérgio Furlani
Verde (SAM E BABI)
Airon (KIKA, FELINA)
Jorge Barreto
Henrique Farias (Capitão Panaca)
Rosana Munhoz (BRASÃO)
Paulo José (BINGO, SAPO XULÉ, O INDIOZINHO SEM NOME, GATOS & CIA, URBANINHO, DR. MURA)

Página de AS AVENTURAS DO INDIOZINHO SEM NOME, personagem de grande sucesso do jornal. Ele buscava realizar um ato de bravura, para aí então, segundo a tradição de sua tribo, ganhar um nome. Mas ele era amigo de todos os bichos e pássaros da floresta, então ficava difícil. Criação de Paulo José. Roteiros de Roberto Munhoz. 

Capa do número 15 ( novembro -1994). Uma bela amostra de boa parte dos personagens que saíam no jornal.

Para que os patrocinadores entrassem no jornal em forma de hq, várias famílias de personagens foram criadas por Paulo José. A saber:
A TURMA DO BUBBALOO (Chicletes Adams)
CHOKITO (Nestlé)
MINI CHICLETES
TODDYNHO
BICANO (canetas BIC)
REACHER (Johnson & Johnson), personagem cujos direitos autorais foram adquiridos pela empresa, para depois utilizá-lo em campanhas publicitárias no Brasil e na Argentina
BIT KIDS (BIT Company)
OS PLAYLOKOS (Playcenter)
LEE KIDS (calcas Lee)
Muitos personagens fizeram tanto sucesso, que ganharam publicações próprias, que circulavam como brinde junto a seus produtos, ou eram distribuídas gratuitamente em diversos locais.

Exemplos de revistas avulsas, com personagens que saíram do KIDNEWS.

OS PLAYLOKOS circularam no Playcenter (tradicional parque de diversões de São Paulo), em revistinhas que ensinavam a utilizar seus brinquedos.
TODDYNHO virou uma série de mini-revistas que vinham de brinde na compra do achocolatado nos supermercados.

Série em quadrinhos do TODDYNHO. A embalagem com três Toddynhos, vendida nos supermercados, vinha com um exemplar de brinde.

Em 1995, KIDNEWS publicou uma série de grande sucesso: OS CEM ANOS DO ÔNIBUS. Em 6 capítulos mensais, patrocinados pela Mercedes-Benz, contava a história desse popular meio de transporte. Para criar o roteiro da série, Roberto Munhoz fez várias visitas aos arquivos da empresa. Assim foi criado o BUS, um ônibus vindo do futuro, que levava duas crianças, Bruna e Renato,
até o ano de 1895, na Alemanha, onde o ônibus fora criado, para contar a sua história até chegar aos dias atuais. Motivou um concurso de redação nas escolas, com direito a prêmios, cujo resultado foi publicado junto ao último capítulo da série.

Capa da edição com o primeiro capítulo da série OS CEM ANOS DO ÔNIBUS.


Página de OS CEM ANOS  DO ÔNIBUS. Roteiro de Roberto Munhoz, desenhos de Altino Lobo, arte final de Patrícia Zaccarias e cores de Alexandre Silva.

KIDNEWS também acompanhava os alunos durante as férias. Em janeiro de 1996, saiu a edição especial KIDNEWS PRAIAS, totalmente colorida, distribuída gratuitamente nas praias do Guarujá, litoral de São Paulo.

KIDNEWS PRAIAS. Sucesso total.

Com o sucesso da publicação, tentou-se levar seus personagens para as bancas. Foi então que em 1995, foi lançada a revista de atividades do SAPO XULÉ, publicada pela própria EDITORA BINGO. A ideia era a de um personagem diferente a cada edição. Porém, esse foi o único número publicado.
Em fins de 1996, a sociedade foi desfeita, e a Editora Bingo fechou. KIDNEWS continuou saindo, pelas mãos de Paulo José, que abriu outra empresa, a Editora Kidnews. Com menos patrocinadores, a publicação caiu para 8 paginas e o seu alcance também era menor.

Capa da Revista de Atividades com o SAPO XULÉ. No número 2, seria o INDIOZINHO SEM NOME.


Dois únicos números lançados da revista KIDNEWS, pela Editora PRESS em 1997.

Em 1997, ainda com o jornal em circulação tentou levá-lo novamente para as bancas. A revistinha KIDNEWS, com 32 páginas coloridas, teve apenas duas edições publicadas pela Editora PRESS.
Com o cancelamento da revista, veio também o fim do jornalzinho KIDNEWS, que tanto divertiu e ensinou crianças e adultos, pois, segundo pesquisa, os pais também liam a publicação.
Para mim, que trabalhei como colorista do tablóide durante quase 4 anos, a falta que faz é a da equipe maravilhosa que se formou. Além de Paulo José e Munhoz, tínhamos o talento de Altino Lobo, artista versátil que desenhava boa parte das hqs (hoje atuando nos estúdios MSP), a arte final do saudoso Wanderlei Feliciano, Tomaz Edson (Estúdio GIBIOSFERA), Patricia Zaccharias, arte finalista oficial do jornal (falecida em outubro de 2012), Denise Ortega, Marcelo Conquista, José Wilson Magalhães, Ana Paula Medeiros, Washington Andrade, Marcia Garbelini, Tania Ramos, Rolando Di Sessa. Saudades também das festas de fim de ano, que reunia todos os colaboradores.
KIDNEWS é pouco divulgado em artigos e publicações que tratam da história de nossos quadrinhos, porque teve uma circulação restrita, porém sua importância é inquestionável. Motivou o desenhista Altemar Domingos a criar em 2007, o EURECA! SUPERKIDS, tablóide infantil também distribuído nas escolas.
Roberto Munhoz atualmente faz parte da equipe de roteiristas dos Estúdios Mauricio de Sousa.
Paulo José retornou aos quadrinhos em 2006, criando roteiros para os gibis do MENINO MALUQUINHO da Editora Globo. Mas voltou mesmo com força total à animação, produzindo em parceria com a Cinema Animadores a série do SAPO XULÉ. Planejado para ter 26 episódios de 2 minutos e meio cada, o projeto foi premiado em 2006 no I MITV (1º. Fórum Internacional de entretenimento, organizado pela Converge Editora / Tela Viva) e a série foi veiculada em 06 episódios em setembro de 2008, pela Rede TV!, sendo a primeira animação brasileira a ser exibida em HD.
O Sapo Xulé foi licenciado pela Estrela e virou boneco de vinil. A série transformou-se em DVD-Books, lançados pela Editora Callis, além da sua musiquinha virar ring tone da TIM. Participou também como convidada no Anima Mundi 2009. Foi exibida no Kidscreen Summit, em Nova York, evento voltado ao entretenimento infantil.

Coleção de DVD-Books da Editora CALLIS, lançada em 2008. 

Vejam que O Sapo Xulé, âncora do nosso saudoso KIDNEWS, continua por aí, aprontando
das suas. Quem sabe, nessas suas andanças, ele não desperte nas pessoas a vontade de ver o velho jornalzinho circulando de novo. Talvez agora como um portal na internet, quem sabe. O quadrinho brasileiro agradece.